Bandido Blogueirinho
Autor – Roger Morais
Trata-se de um verdadeiro multi-artista. Atua como comediante, comunicador, compositor, escritor e de vez em quando arrisca a voz nos microfones. O Bandido Blogueirinho é entrevistado de capa da RAPGOL Magazine desta semana.
Cria da Camarista Méier, no complexo do Lins, Zona Norte do Rio, nosso bandido decidiu mostrar sua cara ao mundo (ou não, pois não vive sem sua balaclava) para mostrar que dentro da cultura Hip Hop o espaço de atuação artístico pode ir muito além de um Mic e instrumentos para produzir beats.
Possui seus canais nas redes sociais com conteúdos em fotos, vídeos e demais postagens que trazem um humor mais próximo da realidade de quem vive nas favelas e periferias. E não para por aí. Sua presença é constante nas ruas, seja em rodas culturais e batalhas de rima, como em outros eventos de grande porte que envolvem o Rap.
É dono do Pod’s Crê, um programa em formato de podcast que traz entrevistas com diversas figuras da música, da política, entre outras áreas. É meu amigo pessoal há mais de 15 anos, e o mundo girou tanto que nos trouxe até essa entrevista a qual tenho imensa satisfação de exibir.
Em uma conversa descontraída, Bandido Blogueirinho contou um pouco sobre sua origem, suas referências de vida e de música, sobre seu papel dentro da cultura Hip Hop, da realidade vivida pelos jovens favelados e periféricos, e, claro, sobre futebol e sportlife, além de adiantar em primeira mão algumas novidades que estão por vir. Confira abaixo:
ROGER MORAIS
RAPGOL Magazine – Fico muito feliz em poder realizarmos essa entrevista, principalmente por se tratar de um amigo meu pessoal há mais de 15 anos. Conta para quem ainda não lhe conhece. Quem é o Bandido Blogueirinho e de onde ele é cria. Bandido Blogueirinho – Eu sempre fico em dúvida se eu mando uma resposta “na risca” ou se eu mantenho a postura. Por hoje, eu respondo que quem não conhece o Bandido Blogueirinho tem que conhecer. Jane Khinny, Jota ou simplesmente Bandido Blogueirinho é cria do Complexo do Lins – Camarista Méier. É alguém de bom coração, favelado raiz, muleque inocente, sempre preocupado em compartilhar o que se sabe e disposto a aprender o que não se sabe. Bandido Blogueirinho é bandido raiz no melhor dos sentidos, é o poder paralelo de um narcodigital influencer voltado pros seus. É bandido no sentido de ratão e também é comédia (entenda comédia de maneira ambígua). Bandido vem de banido, excluído, periférico e o Bandido Blogueirinho também é uma voz resistência que se recusa a ser calada.
RAPGOL Magazine – Vejo você como um multiartista, desempenhando várias funções e papeis dentro do Hip Hop, desde a comédia até o Rap. Pode nos explicar um pouco sobre algumas dessas atividades? Bandido Blogueirinho – Nós acaba reproduzindo o que nos influencia e nos tece como pessoas. Aqui na favela geral é engraçadão e o RAP é uma realidade nossa, desde quando era funk, desde quando era samba. Funk e Samba também são RAP, ou não? E eu sou isso também… RAPGOL Magazine – Desde quando você começou com a personagem e o que te inspirou a criá-la? Bandido Blogueirinho – Tudo bem, você está requisitando “meu cavalo” e eu como entidade suprema vou te conceder isso: “Eu comecei a personagem em setembro de 2020. Estávamos imersos em um pandemia global, um verdadeiro pandemônio. Eu já fiz alguns cursinhos de teatro pelo Brasil por mais que minha pegada sempre foi buscar viver do que eu escrevo, ao invés de atuar. Tava geral meio deprê nesse momento e o Bandido Blogueirinho aparece na minha coroa como forma de sublimar essa energia ruim que rondava e porquê não compartilhar isso com os mais próximos? Acabou furando a bolha e tomando uma proporção um pouco maior. Bandido Blogueirinho é inspirado em muitas coisas, inclusive inconscientes e não cognoscíveis, algumas delas são: bandidos reais que posam de blogueirinho nas redes, a inocência e o “lado B” que os bandidos têm (a parte que a TV não mostra), o ridículo que há em cada um de nós, o que não pode ser dito, mas precisa ser dito, a quinta série que nos assombra eternamente, entre outros.”
RAPGOL Magazine – Quais são as suas maiores referências musicais? Bandido Blogueirinho – Coisas novas de todas as vertentes me chamam atenção, mas é inegável que o Samba, o Pagode, o RAP e o Funk são minhas maiores referências. Quando digo Samba vai dos clássicos até às rodas de samba top do RJ e compositores esquecidos no passado e no presente. Pagode na favela é swing né pai?! Desde de Ceceu Muniz até Dilsinho. RAP vai dos clássicos até quem tenta não perder a essência hoje e Funk desde os proibidão até a famosa putaria. Sou apaixonado por música e por muitos artistas, mas por hoje posso afirmar que sou fã de apenas dois artistas: Ludmilla e Will Freitas. RAPGOL Magazine – Quais você pode apontar como as suas maiores dificuldades, obstáculos como artista? Bandido Blogueirinho – As estruturas em geral não são feitas pensando os pobres, os periféricos, os ban(d)idos e, nas redes sociais não é diferente. O nome Bandido Blogueirinho, o uso da balaclava, as temáticas que são abordadas, tudo o que sou dificulta a subida. Apenas no Tik Tok, por exemplo, somando as três contas que perdi no primeiro ano de trabalho, são praticamente meio milhão de seguidores perdidos. É realmente uma pica, mas eu continuo. RAPGOL Magazine – Além do Hip Hop, você curte muito um sambinha que eu sei… Inclusive compõe alguns sambas. Explica melhor isso pra gente. Bandido Blogueirinho – Mais uma vez você requisita o “meu cavalo”, vou te dar essa moral novamente: “O Samba sempre fez parte da minha história, a composição também. Comecei compondo na Umbanda e na Capoeira e nunca quis me envolver com samba (enredo), pois desde menó via a sujeira que era. Porém de vez em quando vinha na cabeça um sambinha raiz e eu não deixava passar. Hoje, graças ao Bandido Blogueirinho e suas conexões eu faço parte de um movimento chamado Aos Novos Compositores que vem sendo uma escola pra mim e me desenvolvido mais ainda nesse ramo, lá apresento grande parte das minha composições.” RAPGOL Magazine – Você realiza apresentações de Stand Up Comedy em rodas culturais e batalhas de rima pelo Rio de Janeiro. Como você acha que conseguiu obter esse sucesso em algo que não é tão comum de se ver? Bandido Blogueirinho – Isso acredito ser bem simples. O RAP se presta a quê? Então, a minha arte também se presta isso. O RAP tem a tendência de ser muito duro, é uma característica raiz, o humor já é água, é mole, desliza, escorre, nesse sentido acredito que seja a união perfeita. Quero abrir o show de muita gente e quando meus shows estiverem na pista com certeza sempre vai ter alguém do RAP pra abrir. É importante falar que estamos nas escolas também. Último show de standup do Bandido Blogueirinho foi dentro de um CIEP, no Caju, à convite de uma Biblioteca Comunitária.
RAPGOL Magazine – Nas suas redes sociais, você costuma retratar com bastante humor, situações de vivências que todo mundo que mora dentro de uma favela já viu ou já passou por isso. Qual a situação mais cômica que o Bandido Blogueirinho já teve que passar? Isso é complexo porque são realmente muitas, porém tem uma que marcou. Estávamos produzindo o clipe da música Desafio do MC Fernandinho e DJ 2R. Comandei a carreata pra um Morro lá na Zona Sul onde seria gravado o clipe. Desembarcamos no meio de uma reserva, três carros cheios com as pessoas envolvidas no mesmo, e fomos descendo do alto do morro para quadra onde seria gravado. O MC Fernandinho, irmão do Duduzinho, me ligou pedindo pra guiar a rapaziada que ele já estava chegando e o bandidos locais nos aguardavam na quadra. Chegamos, fomos bem recepcionados e aguardávamos para iniciar o clipe. Tirei a camisa por conta do calor e o frente do morro, ao ver minha tatuagem no peito, saiu da piscina e veio na minha direção, broncudão: – Dá o papo reto! Tu que é o Bandido Blogueirinho né? Ele falava enquanto olhava pra tatuagem. Meu cu gelou, essa onda de bandido evangélico que é intolerante tá fudendo grande parte do rolé. Mas não tinha como negar. Se for pra morrer pelo que eu acredito já é também, pensei. – Sou mano, pq? Falei já esperando o pior. Ele abriu um sorriso, falou pros outros bandidos que eu era o Bandido Blogueirinho, geral conhecia o trabalho. Disse também que me conheceu através do pai que era viciado em Tik Tok e me amava e ordenou: – Tu vai fazer um vídeo pro meu pai, ele vai ficar maluco, bota a máscara aí! Atendi prontamente e pude relaxar o esfíncter.
RAPGOL Magazine – A maioria das crianças que nasce dentro de uma comunidade sonha oujá sonhou em brilhar em campo no futebol, seja por amor ao esporte, como também por um meio de sustento de si e de sua família. Como você enxerga a influência desse esporte dentro da vida dessas pessoas? O esporte sempre salvou e sempre vai salvar vidas, seja ele qual for. O futebol tá no DNA do brasileiro. A figura do bandido graças a Oxalá vem perdendo força enquanto referência nas comunidades, mas ainda é forte. Porém só uma figura na comunidade tem força maior que a figura do bandido e com certeza é o jogador de futebol. Grande parte da galera baba ovo de bandido como “os cara”, mas os bandidos babam o ovo dos jogadores de futebol da favela. Isso por si só acho que já diz tudo, inclusive o caminho. RAPGOL Magazine – Qual o time do coração do Bandido Blogueirinho, e porque? Bandido Blogueirinho – Vermelhão, time lá do Morro, histórico. Campeonato de favela é oto patamar, não tem jeito. Por mais que eu aborde pouco a temática nos perfis, eu sou Flamengo, mas hoje em dia em não acompanho tanto e por isso fico mais calado. Mas com essas paradas de bet, apostas eu tô voltando a acompanhar o que não sei até que ponto é bom ou ruim.
RAPGOL Magazine – Quais são as suas camisas de time prediletas? Bandido Blogueirinho – Porra, camisa de time é A estética de favela. Camisa de time, calça ou bermuda jeans e um pisante bolado é look pra qualquer lugar e tá bem chegado. Eu sou apaixonado por todas, mas infelizmente não tenho verba pra isso, o que me dói demais. Eu queria exatamente todas meu mano. Acompanhando a Copa, eu fico maluco, não só com as camisas de jogo, mas as de treino, as do aquecimento, os casacos, é surreal. Mas pra não deixar passar batido sem citar nenhuma, eu tive uma madre pérola do Pirlo que eu lembro até hoje e a do Madureira com o Che Guevara é sacanagem. Se eu pudesse escolher uma camisa dessa Copa escolheria a do Senegal.
RAPGOL Magazine – Quais são os seus atletas favoritos? Bandido Blogueirinho – Marta com certeza é a maior de todas. Ela é minha favorita. RAPGOL Magazine – Existe algum momento do futebol que jamais vai sair da sua cabeça? Bandido Blogueirinho – Vários, mas poderia citar dois: o primeiro quando Brasil perdeu pra França na copa de 98. Tava geral lá em casa, uma animação fudida e mudou o clima drasticamente com a perda do Brasil. Eu era criança, mas lembro muito disso, como a gente pode migrar de um estado de felicidade pra tristeza absoluta muito rápido. O segundo foi quando o Vermelhão foi campeão da Libertadores contra o time do Sampaio, no campo deles. Saíram 3 ônibus nosso pra torcer, a ida, a volta, a festa no Morro foi tudo surpreendente. RAPGOL Magazine – Acredita que o Brasil possa conquistar o hexa este ano no Catar? Bandido Blogueirinho – Irmão, eu tenho mó fé nisso, depois de expulsar o WOLDEMORT da presidência, a gente merece isso enquanto povo pra dar um levante. Só acho que tem que apostar na juventude que é soltinha no pagode e jogar o futebol brasileiro, bonito, arte, inventivo, se fizer o jogo europeu que todas as seleções treina aí fode.
RAPGOL Magazine – Você possui um canal no YouTube com conteúdos que me fazem chorar de rir, além de um podcast. Você pretende retornar com essas atividades? Bandido Blogueirinho – Eu dependo do público. Eu gostaria de estar vivendo disso? Óbvio. Tem duas questões importantes nesse sentido. Quem acompanha percebe que o conteúdo mudou um pouco, nesse aspecto, por dois sentidos: as mudanças constantes das próprias plataformas que nos obrigam a modificar os formatos também e ter me mudado da Camarista pro Rato. Lá eu saio na rua pra comprar pão, já perguntam se eu vou gravar e estão disposto a tudo. Aqui eu nem sei quem me segue e é impossível administrar tudo e fazer as milhares coisas que faço sem ganhar um real por isso. O podcast é o que mais me dói não ter voltado e vamos voltar sim, só não sei quando. Temos a equipe, uma produtora pra fazer a parada acontecer, mas não posso onerar essa rapaziada que me ajuda, então se alguém quiser patrocinar o movimento e pagar nossa enxuta equipe de 7 pessoas pra fazer a coisa acontecer a gente tá aberto.RAPGOL Magazine – Vejo ainda que você constantemente realiza ações que visam a dar um pouco de alegria para crianças de comunidades carentes do Rio de Janeiro. Tem ideia de quantos rolés desse você já deu ao todo? São muitos irmão, essa é e sempre vai ser uma constante, mas eu não divulgava, por achar que não se deve divulgar isso, que seria uma vaidade. Mas para fazer isso eu preciso necessariamente de ajuda e percebi que divulgar desperta as pessoas para fazer também. Mas desde antes do Bandido Blogueirinho inúmeros projetos foram e são feitos, é só acompanhar. No momento que estou escrevendo por exemplo, são 01:30 da manhã e acabei de voltar de uma dessas ações patrocinadas pelos “MEUS FÔ. Levamos 30 crianças da favela pra assistir o filme Wakanda e depois pagamos lanche do MC Donald’s pra todas elas. A grande maioria nunca tinha ido num cinema nem nunca tinham comido no Mc Donalds.
RAPGOL Magazine – Poderia citar cinco artistas que, para você, merecem maior atenção do público em geral? Bandido Blogueirinho – Bandido Blogueirinho, Will Freitas, André Gabeh, Carol Cardoso e Devilzinha. RAPGOL Magazine – Quais as próximas novidades que podemos esperar do Bandido Blogueirinho? Bandido Blogueirinho – Dia 19 de dezembro tem lançamento da música ‘Os Cara Que Oprime’ (Bandido Blogueirinho, De Leve, Negra Rê e wellNinja) com Baile e mesa de debates. Dia 19 de janeiro tem lançamento do primeiro love song: ‘Mate com Limão’ e espero em 2023 fazer um especial de humor na comunidade, voltar com o Pod’s Crê, fazer muitos shows e ações em conjunto com a galera que acredita e prosperar para continuar fazendo. RAPGOL Magazine – O que mais te alegra no Bandido Blogueirinho? Bandido Blogueirinho – Saber que não é só por mim. Enquanto não for nós por nós, sempre vai ser eles e desde que o mundo é mundo só dá eles. Chegou a hora de nós chegar. RAPGOL Magazine – Gostaria de deixar alguma mensagem para o pessoal que nos acompanhou até aqui? Bandido Blogueirinho – Sim: VOCÊ É GUERREIRE DEMAIS, chama lá no privado do Instagram @bandidoblogueirinho e me fala o que achou dessa entrevista. Quero saber quantas pessoas acompanharam até o final.