Conheça o EP Noites & Neblinas de Dedé e Enejaru

O EP ‘Noites & Neblinas’ é uma experiência que mistura sonoridades e vivências reais, trazendo um olhar artístico sobre as contradições da urbanização e o cotidiano da periferia nordestina. O objetivo desta matéria é apresentar dois artistas nordestinos que fazem um trabalho incrível no interior do Ceará.

O artista Dedé fala diretamente de Tianguá – CE e traduz no EP ‘Noites & Neblinas’ como as transformações urbanas e vivência periférica. Com uma trajetória fortemente influenciada pelo Hip-Hop, Dedé começou sua caminhada nas batalhas de rap, slams e eventos culturais de rua.

Enejaru foi responsável pela produção musical e os beats do EP ‘Noites & Neblinas’, o beatmaker vem se destacando pela fusão de ritmos e experimentações sonoras. Enejaru transita entre afrobeat, boombap, grime e guitarrada caribenha.

Confira a papo que tivemos com Dedé e Enejaru sobre o EP ‘Noites & Neblinas’ e também suas visões sobre o rap nordestino!

Qual a principal mensagem que ‘Noites e Neblinas’ deseja passar para o público, em termos de letra e som?

Acreditamos que a principal mensagem que sintetiza o projeto seja as vivências reais inseridas em nosso contexto geográfico, por exemplo, na faixa que intitula o nome do EP “Noites e Neblinas”, pode-se notar o seguinte verso: “Passou do viaduto já vai mudando o clima, onde o baculejo já virou rotina, te abordam de acordo com o tom da melanina…”

Tal verso cita diretamente uma recente construção que segregou ainda mais a cidade, estabelecendo uma divisão mais visível entre duas camadas sociais, a classe favorecida e a parte vulnerável. Além de letras marcantes como essa, a sonoridade do EP vem com as nuances do que é escutado nas ruas de Tianguá, observando as faixas pode-se ver que a sonoridade é vasta, de músicas mais dançantes como ”Esquinas” & ”Segundo Passo” até músicas mais densas como ”Mais um Rap do Silva” e ” Noites & Neblinas”, importante citar também a escolha de samples, não só de melodias e afins mas de sons ambientes cada vez mais presentes, acompanhando a crescente urbanização que caracteriza nossa cidade, tais como: sirenes, tambores e afins.

A faixa ‘Segundo Passo’ aborda uma visão em torno da vivência periférica num mundo capitalista, falando sobre as lutas enfrentadas e a resistência. Nesse caso, o que representaria o título “Segundo Passo”?

Em relação ao título, “Segundo Passo” é a continuação da minha primeira música lançada, que obviamente chama-se “Primeiro Passo”, vale salientar que os títulos foram propositalmente pensados no intuito de firmar uma intertextualidade e continuação. Se você reparar bem, “Primeiro Passo” fala sobre idealização de conquistas e “Segundo Passo” já aborda, ainda que inicialmente, algumas conquistas estabelecidas, porém não se isenta de questionamentos e anseios que ainda perduram.

Quais foram as inspirações que permitiram a criação da faixa ‘Mais Um Rap do Silva’?

Pode-se concluir que a própria faixa original “Rap do Silva” do MC Bob Rum é uma inspiração fundamental para essa releitura. Dedezaum quis extrair  e contar um pouco mais sobre esse personagem tão comum e que sintetiza a face da sociedade brasileira. Além disso, demonstrar que assim como tantos Silvas que existem nesse país, cada qual tem sua realidade e particularidade. Tendo em vista o sample da faixa do Mc Bob Rum foi construído um boombap juntamente com um sample de R&B para trazer aquela emoção a mais, o beat se estende por longos 6 minutos, contudo leva uma simplicidade que permitiu Dedezaum escrever com liberdade a sua crônica versada. 

A coluna ‘Descentralizando’ tem como objetivo falar sobre artistas do Rap que são do Norte e Nordeste. Aproveitando que vocês abrirão nossa coluna em 2025, quais são as expectativas a respeito da ampliação do Rap nordestino para este novo ano?

Acreditamos que uma grande vantagem do Rap no Norte e Nordeste é a versatilidade, e isso desde sempre, não é algo de agora, mas acredito que o devido valor esteja perto de chegar, temos muitas jóias raras na composição do Rap aqui no Ceará por exemplo, vemos pessoas como: Cabulosa, Má  Dame, Emiciomar e Krm que vem trazendo trabalhos sólidos de Fortaleza, também podemos citar, Canalujo  Mob, Madazin e JardelReal808 em Sobral, Malino Mc e Ryuk em Tianguá e muitos outros que eu posso citar, como Neggs em Teresina que acabou de lançar um álbum lindo, vejo  que uma nova era de Mc’s plurais com versatilidade vem chegando com trabalhos cada vez mais consistentes.

A produção musical do EP é um grande destaque, além das composições feitas por Dedé, pode nos contar sobre como foi esse processo de produção e criação dos instrumentais?

Interessante porque apesar de eu sempre gostar muito de produzir sozinho e com as minhas ideias, ‘Noites & Neblinas’ foi o meu ponto de entendimento como produtor, aprendi a escutar muito a opinião e as trocas em relação às minhas produções, foi uma chave, sabe? Eu usei muitos samples colhidos juntamente com o Dedezão, que foi parte fundamental na produção. Foi desafiador tentar mostrar nossa cidade atrás da produção desse EP. Acho que o meu maior processo foi esse, tentar manter Tianguá ali mesmo que pegasse um sample de um maestro argentino, como aconteceu na faixa segundo passo por exemplo. Foi aí que bateu a essência do N&N, esse trampo ele é a síntese da grande mudança de Tianguá, a gente foi engolido pela rápida urbanização da nossa cidade, isso refletiu sistematicamente como a gente faz música.

Mesmo com os desafios apontados para artistas nordestinos, Dedé e Enejaru seguem firmes na missão de dar voz às suas histórias por meio da música. Conheça os trabalhos dos artistas e adicione na sua playlist. Amplificar artistas nordestinos deve ser o novo foco de 2025. Fale de nós!