Mamacita Lopes falando sobre maternidade real, moda, costura e rap

Mamacita Lopes falando sobre maternidade real, moda, costura e rap

ywAAAAAAQABAAACAUwAOw==

Aline Lopes ou melhor, Mamacita, como é conhecida e reconhecida nas ruas é mais uma jovem cheia de sonhos e disposta a realizar, enfrentando todas as adversidades que a vida da mulher trás.

Aline foi mãe a primeira vez aos 27 anos e desde então vem compartilhando nas redes sociais sobre essa luta diária e cansativa que uma mãe carrega, de uma forma bem clara e realista, sem gourmetização alguma dessa experiência única.

Mamacita também foge do padrão na profissão, costureira de paixão, dona dos maiores panos de Curitiba, trabalho totalmente artesanal, árduo e duro, feito diariamente para chegar nos resultados obtidos nos drop´s que disponibiliza de época em época em seu instagram, já fez trabalhos para o rapper Dow Raiz e para a marca Last Dose, além de outras colaborações.

Confira esse bate papo firmeza abaixo.

ywAAAAAAQABAAACAUwAOw==RAPGOL Magazine: Salve Mamacita, obrigado por topar essa conversa conosco, se apresente.

Mamacita Lopes: Salve Salve Malocas e Madres, primeiramente eu agradeço o convite e a oportunidade de poder estar aqui compartilhando um pouco da caminhada com vocês. Para quem não me conhece eu sou Mamacita Lopes, de CWB, mulher- mãe, cientista social; estudiosa da sociologia da cultura e costureira de streetwear. Tenho 33 anos, um menino de 5 anos chamado Zion que é a pessoa que vai ser o ponto de virada para existência da mamacita que vos fala e mãe do Ramon que deve chegar nesse mundão no começo de agosto.

RAPGOL Magazine: Quando você se descobriu como Costureira?

Mamacita Lopes: Assim que comecei a transitar no movimento hip-hop, ficou evidente que a maneira de vestir ultrapassava a experiência estética. Ela era um momento de identificação, transmitindo qual é o nosso discurso ao mundo. E quanto mais as escolhas feitas eram compatíveis com as escolhas de determinado grupo, gradativamente elas possibilitavam fazer parte do grupo. Durante minha adolescência, sempre optei por roupas mais largas e confortáveis, influenciada tanto pela música quanto pelo basquete. Toucas, bonés, bandanas, tênis e moletons. Tudo que pudesse assegurar o movimento do meu corpo com total liberdade. Parte da minha mistura se devia ao fato de que na época quase não existiam lojas voltadas ao que chamam agora de streetwear e, quando dizia respeito ao público feminino, era ainda pior. Então eu costumo dizer que esse era o bichinho sempre me corroía, uma vontade de se expressar através das roupas, porém a falta de vestimentas que pudessem estar de acordo com isso. Tendo essa vivência como guia, quase 15 anos depois, eu tive a oportunidade de ser aprendiz em um pequeno ateliê perto do centro de Curitiba e hoje quase oito anos depois eu produzo moda streetwear independente e cheia de significado e luta política. Essa é a expressão artística que o Hip Hop me trouxe, para além das rimas, batidas, dança ou desenho.

RAPGOL Magazine: Como sua família reagiu a sua escolha?

MamacitaLopes: Durante muito tempo minha família se resumiu a minha mãe, ela sempre foi atrás de várias oportunidades para que eu conhecesse ao máximo as minhas possibilidades. Fosse uma aula de teatro ou um treino de basquete. Eu sempre tive dentro de mim a certeza que poderia escolher qualquer caminho, como se eu fosse capaz de tudo. Na adolescência quando nossa condição de vida melhorou eu tive o privilégio de tentar viver do sonho, eu tinha condições básicas para isso: um teto sob a minha cabeça e uma cama no meu lombo. Sempre que possível minha mãe me ajudou com pequenos gestos como por exemplo: Quando comprei minha primeira máquina de costura, uma Singer caseira que uso até hoje, lembro dela ter se oferecido para pagar metade do valor.

RAPGOL Magazine: Costura é um trabalho que tem bastante mercado em São Paulo, em Curitiba, como é o mercado dessa profissão?

Mamacita Lopes: É muito importante que haja uma conscientização sobre a precarização do trabalho da costura enquanto vemos o glamour de diversos estilistas pelo mundo temos coywAAAAAAQABAAACAUwAOw==mo contrapartida uma categoria pouco assistida e que na maioria das vezes não está sendo remunerada como deveria. A costura de um modo geral oferta um serviço que chamamos de facção, onde basicamente cada pessoa é responsável pela costura de apenas uma parte da peça, por exemplo uma pessoa prega bolsos, outra pessoa as golas, uma terceira faz o fechamento lateral das peças, enquanto uma última revisa todas as costuras. Segue basicamente uma lógica de linha de montagem. É muito comum vermos denúncias de trabalho análogo ao escravo nos ambientes de costura. Enquanto algumas marcas vendem suas camisetas por R$100 as pessoas que fizeram essa peça recebem em torno de R$3,50. A primeira marca que criei se chamava Circle, círculo em inglês, tinha como objetivo chamar atenção para uma valorização do trabalho do fazer manual. Apenas para ilustrar já que estamos no Dia das Mães, quando eu estava grávida de oito meses do Zion fiz algumas diárias em um ateliê de facção. O objetivo era fazer o maior número de camisetas no mesmo dia das 8 às 18 horas por R$ 40, uma passagem de ônibus e meia marmita. Acho que vocês podem tirar suas conclusões. Tudo isso para dizer que o trabalho que eu faço foi conquistado abrindo a mata no facão, principalmente para alguém que não tem curso superior na área e é autodidata. A comprovação, o diploma do nosso saber quem deu foi a rua.

RAPGOL Magazine: O corre é longo e árduo, ainda mais no nosso caso que fugimos do padrão que a sociedades nos impõe, qual a dica você dá pra pessoas que querem seguir seus sonhos?

Mamacita Lopes: A primeira coisa a se dizer nesse caso é que ninguém aqui é hipócrita, é importante identificar os pequenos privilégios que nos cercam e possibilitam de uma forma ou outra que façamos isso, no meu caso eu tinha um teto e o apoio da família por exemplo. mas para além fatores externos o que eu posso dizer é nunca desistam de vocês, Disciplina, constância, força de vontade, descanso. Para mim nunca foi uma possibilidade deixar de me expressar através da minha arte, embora muitas vezes ela tenha tido que se reinventar para caber na minha vida. O que é um movimento totalmente normal na nossa trajetória: reconhecer a mutabilidade das coisas é reconhecer a única forma de fazê-las perdurar. Nem todos os dias estaremos supermotivados e criativos, mas reconhecer nossos ânimos olhar para si com atenção é o que nos dá o respeito necessário para conosco, reconhecer a hora de descansar, reconhecer a hora de criar, reconhecer a hora em que a mudança é a única forma de não nos perdemos de nós mesmos.

ywAAAAAAQABAAACAUwAOw==

RAPGOL Magazine: Vimos no seu Instagram que você já fez roupas para o Dow Raiz, como funciona seus drops e a venda dos seus produtos?

Mamacita Lopes: Sim o Dow é um dos clientes que tem mais peças minhas, quando ele me procurou foi justamente pela característica da exclusividade dos meus produtos. É muito comum vermos peças sob medida em roupa social, mas durante a minha experiência percebi que era necessário que houvesse roupas sob medida no streetwear, pois a modelagem padrão que encontramos nas peças por aí muitas vezes não compreendem as medidas do tipo de roupas que usamos. Por conta do corre ser independente não houve um investimento financeiro inicial para que pudesse ser feito um estoque de peças, esse foi o fator principal que conduziu meu trabalho para os drops, que são feitos com tecidos e materiais que vou juntando ao longo de trabalhos diversos mesclados com novos materiais que adquiro, sempre pensando na melhor maneira de não acumular coisas no meu ateliê. Fazendo assim com que as coisas girem mais rápido, uma moda mais sustentável. Todo drop tem uma história e um motivo por trás do nome, das cores da música, dos tecidos, dos modelos das roupas, todos eles são basicamente fragmentos de fases que eu passei ao longo da minha carreira. Logo, não são previsíveis, além disso a maioria dos meus trabalhos é mesmo feito sobre o prisma da exclusividade e personificação das peças já que a ideia de tudo que eu costuro é seguir além da estética, o fluxo das pessoas, diferente de uma pintura, é o movimento, o gesto de quem veste que dá vida a minha arte.

ywAAAAAAQABAAACAUwAOw==RAPGOL Magazine: E hoje, vemos você compartilha a maternidade real nas suas redes sociais, como você vê essa gourmetização da mãe solo?

Mamacita Lopes: Essa gourmetização já é uma história bem antiga que vem de toda aquela fábula da Mãe Guerreira que tudo sacrifica e que tudo faz pelos filhos. A maternidade real nada mais é um movimento tenta humanizar as mulheres- mães que são constantemente julgadas quando suas escolhas não são compatíveis com essas duas coisas que citei anteriormente, é esperado na nossa sociedade que os filhos sempre sejam a prioridade na nossa vida, uma visão muito irreal, todas as mulheres-mães são pessoas que sentem, que sonham. Não é justo que a mão do mundo pese tanto sobre os nossos ombros, não é justo que se exija de nós que todas as nossas escolhas sejam pensadas APENAS para o bem das crianças. Isso não se sustenta a longo prazo já que nenhuma de nós é apenas uma coisa, nenhuma de nós é apenas mãe.

RAPGOL Magazine: Com Zion crescendo loucamente, que dica você dá para as mães que carregam essa responsa no peito diariamente?

Mamacita Lopes: A dica é não tem dica. Cada uma de nós sabe exatamente o que deve fazer, confiem no instinto de vocês, firmem os pés no chão e não deixem que ninguém diga para vocês o que é melhor para sua cria. Muito menos que digam o que vocês podem ou não fazer depois de se tornar Mãe. E principalmente, não aceitem palpites de quem não está no corre do dia a dia com vocês, eles provavelmente não sabem de nada. Deixe que falem.

RAPGOL Magazine: Agora sobre rap, você tem acompanhado a cena, o que você gosta de ouvir nas horas vagas?

Mamacita Lopes: Eu sou da geração do Underground. Muito do que eu escuto hoje em dia é o mesmo do que eu ouvia a 15, 10, 5 anos atrás. Eu tenho por hábito ser meio repetitiva com alguns padrões, especialmente com música. Para que uma coisa nova entre na minha playlist é preciso que me chame atenção de alguma maneira porque eu dificilmente tenho tempo para pesquisar sobre novos lançamentos e coisas do tipo. Acredito muito que de alguma forma a música ela chega até você, não tenho também mais algumas amarras que tinha há 15 anos atrás sobre assuntos abordados nas músicas, se a música me toca eu simplesmente ouço. O que eu escutei muito nos últimos dias foi no trabalho novo da Iza Sabino que é perfeito para deixar no repeat enquanto trabalho, porque inclusive eu só consigo costurar usando fones de ouvido, parece que isso faz com que a minha concentração na costura aumente, minha concentração no momento presente e na linha reta que preciso fazer com a máquina. E o trabalho novo do KayBlack eu ouvi muito apesar de ser uma linha que tende mais para o Trap.

RAPGOL Magazine: Tem algum show que te marcou e quer compartilhar com a gente sua experiência?

Mamacita Lopes: Com certeza foi o show da turnê de 25 anos do Racionais Mc’s. Quando adolescente eu não tinha permissão para ir ao show deles, depois de uma certa idade eu tentei outras inúmeras vezes colar, mas sempre alguma coisa dava errado. Nesse dia, nesse show especificamente parece que tudo deu certo. Meus amigos estavam presentes, ganhamos os ingressos, só as clássicas foram tocadas e eu nunca esqueço do cenário do show que era incrível, uma baita de uma lua cheia atrás dos prédios da cidade e conforme o show ia rolando a lua ia ficando alta até que amanheceu o dia e ela virava um baita de um sol brilhante.

ywAAAAAAQABAAACAUwAOw==RAPGOL Magazine: Agora vamos para um bate papo rápido, como você se imagina daqui 10 anos?

Mamacita Lopes: Esse é um tipo de pensamento que eu não tenho por que se tem uma coisa que a maternidade me ensinou é que a gente precisa estar com o pé muito firmado no presente porque se a gente garante um bom dia de hoje provavelmente daqui a 10 anos a gente vai estar num lugar bom.

RAPGOL Magazine: Uma cidade que sonha conhecer?

Mamacita Lopes: Uns anos atrás eu estive numa região da Espanha, que é a região da Andaluzia, isso influenciou muito a minha forma de fazer roupa e com certeza deu a força final e poética para o nascimento da Mamacita Lopes. Eu tenho muita vontade de ir pra região da Sevilha, agora no segundo momento, justamente para me aperfeiçoar nessa coisa da costura e da cultura Flamenca que é uma coisa que eu pretendo misturar com o streetwear.

RAPGOL Magazine: Qual a música que define sua vida?

Mamacita Lopes: Essa é praticamente impossível de ser respondida porque para cada dia, para cada momento, para cada coisa a música sempre teve ali. De maneira geral, eu teria que fazer pelo menos uma lista de 30 músicas para poder responder isso.

RAPGOL Magazine: Um sonho que quer realizar?

Mamacita Lopes: No momento é fazer um curso de costura flamenca nessa região que eu citei lá na Espanha.

RAPGOL Magazine: Um sonho realizado?

Mamacita Lopes: Poder trabalhar com o que eu amo com certeza é uma das maiores realizações, agradeço a mim mesma por nunca ter desistido de mim.

RAPGOL Magazine: Vemos que você gosta de artistas latino-americanos, cite 3 para a gente ficar de olho aí.

Mamacita Lopes: Aqui tem o Pitt Blanco que faz uma música regional mexicana bem diferenciada, que mistura um pouco de trap de rap e ele lançou um disco em outubro do ano passado que eu ouvi uns três meses direto que se chama “Baseado em hechos reales”, tem o Nanpa Básico que tem um pezinho no rap mas faz uma coisa mais melódica que eu gosto. Vou citar só esses dois que são os que eu mais escuto, e como eu disse, normalmente quando eu gosto de alguma música eu costumo ir o mais fundo possível naquele artista, assim dá para ganhar pela qualidade e não pela quantidade.

RAPGOL Magazine: Acho que é isso Aline, obrigado pelo bate papo. Deixe seu salve final.

Mamacita Lopes: Então é isso gente quem quiser saber um pouco mais do trampo e de todos esses processos é só acompanhar lá no Instagram @mamacita.lopes que sempre que dá eu tô postando alguma coisa por lá, agradecer quem chegou até aqui nessa linha pelo tempo e curiosidade com o meu trabalho e no mais é isso gente. Um dia de cada vez, uma conquista de cada vez, coisas boas, coisas ruins, fé pra tudo. Assim que se constrói uma carreira é assim que se constrói uma vida. Besos da Mamí.

Joaozin

Jornalista, fotógrafo, amante do rap nacional e fã nato do Baianinho de Mauá.

Eduardo Taddeo e outros amigos, prestam últimas homenagens ao rapper DumDum, veja o vídeo Postagem anterior Eduardo Taddeo e outros amigos, prestam últimas homenagens ao rapper DumDum, veja o vídeo
Coruja BC1 e Rincon Sapiência estão juntos no hit “Casinha” Próxima postagem Coruja BC1 e Rincon Sapiência estão juntos no hit “Casinha”
error

Gostou do site? Compartilha com geral!