Quem está acostumado a ouvir Grime ou Drill sabe que geralmente grande parte das composições trata de violência urbana, de ausência do Estado (ou de sua má atuação), e temas próximos, tendo em vista o fato de esses assuntos serem justamente a realidade cotidiana desses artistas.
Contudo, a conversa desta semana tentará trazer ao leitor uma outra visão acerca do gênero. É que o Rapgol teve a oportunidade e a honra de bater um papo com o cantor e beatmaker carioca Tárcis.
Tárcis é integrante do coletivo Covil Da Bruxa, que conta com a participação de artistas que a cada dia ganham ainda mais espaço na cena, como VND, TOKIODK, OG BRITTO, LINUS, LEALL, Pumapjl e outros.
Diferentemente da maior parte das músicas produzidas pelos artistas do gênero, o cantor busca trazer em seus trabalhos uma mensagem que vai além da criminalidade, mostrando a parte sensível humana, seja nos seus relacionamentos amorosos, familiares ou no cotidiano urbano.
Até o presente momento, Tárcis construiu três grandes trabalhos, sendo estes:
Maitê: Misticidades, Amores, Inspirações, Teorias e Expirações (2018)
Canções Que Fiz Para Você: (2019)
Cyberyorubá 10062: (2020)
Um traço marcante e característico do artista é a forte presença de sua religiosidade de matriz africana. É evidente a influência de sua espiritualidade, além de vertentes eletrônicas como o House, Garage, além dos próprios Grime e Drill.
RAPGOL – Em primeiro lugar, poderia nos contar o que o motivou a levar a sério a música em sua vida?
Música é a única coisa que eu sei fazer e sempre foi meu sonho viver dela, a verdade é que meu sonho sempre foi ser do samba por influência familiar, mas o Hip Hop me roubou do gênero. Desde 2014 que eu venho melhorando a forma como veem meu trabalho, porque pra mim sempre foi algo sério, porém sou um artista independente, sem muito recurso e entregar da forma mais profissional possível tudo que eu faço foi e ainda é meu objetivo.
Tárcis
RAPGOL – Como e quando você resolveu adotar esse seu estilo mais particular, adotando gêneros como o Grime nos trabalhos produzidos?
Tárcis – Não tive muito problema quanto a isso, o Grime se assemelha muito na forma de compor com o samba, as cantigas de capoeira e as cantigas de religiões de matriz africana, e essas são as minhas referências rítmicas desde que me entendo por gente, então não teve muito mistério para executar.
RAPGOL – Uma coisa que se vê muito presente em suas músicas é a questão da sua religiosidade. O que inspira e como você consegue fazer a síntese entre a matriz africana nas suas produções musicais? É fácil?
Tárcis – Toda música que nasce no brasil tem influência do candomblé, direta ou indiretamente, o que eu fiz foi só mostrar que mesmo em continentes diferentes o Grime e o Drill, que são estilos musicais pretos diaspóricos, trazem uma memória ancestral.
Cantar minha fé parece fácil, mas é muito mais complexo do que parece, porque vivemos em um país extremamente intolerante, então eu sei que é um desafio quebrar essa barreira e eu estou quebrando.
RAPGOL – Como é a relação e a troca com os demais parceiros da Covil Da Bruxa?
Tárcis – Somos uma família, e vivemos boa parte do tempo em total harmonia um respeitando o espaço do outro que é o mais importante.
RAPGOL – A questão da pandemia do Coronavírus mudou muito seus planos e projetos? O EP CyberYorubá 10062 foi lançado no início dessa tragédia que assola nossa sociedade. Após isso, você tem desenvolvido trabalhos ou tem prorrogado os projetos?
Tárcis – O meu crescimento como artista foi em meio a pandemia, então eu não sei distinguir se ajudou ou atrapalhou, mas deixou aquele gostinho de querer fazer show do CyberYoruba e não ter feito. Graças a Oxalá eu estou conseguindo tocar os projetos sem precisar adiar.
RAPGOL – Quais são as suas grandes referências musicais?
Tárcis – As pessoas em geral, gosto muito de observar as pessoas como elas se movem e contam suas histórias e isso me inspira bastante a compor.
RAPGOL – Você é fã de futebol? Consegue associar com a música?
Tárcis – Eu não diria fã de futebol, mas sim fã do Flamengo. Eu não sou o melhor artista para associar até porque sou péssimo jogando bola, mas tudo a gente consegue transformar em música.
RAPGOL – Qual sua camisa de time predileta?
Tárcis – Flamengo de 81 e a da Nigéria da copa de 2018.
RAPGOL – Possui já novos projetos em andamento? Pode nos adiantar algo desde já?
Tárcis – Estou com meu disco em andamento, com previsão de lançamento para o segundo semestre deste ano, mas antes vai rolar alguns singles e outros projetos a parte.
E se Tárcis afirma que há projetos já em andamento, o público pode confiar. Pois o trabalho do músico vem demonstrando força a cada dia. Confira as faixas do último EP de Tárcis: